Caro leitor, provavelmente você já ouviu
ou até reproduziu frases como “imposto é roubo “ou “o brasileiro não aguenta
mais o peso desta carga tributária” ou então “pago impostos, mas não tenho
saúde e educação de qualidade.”
De janeiro a julho do ano de 2020, de
acordo com o site Impostômetro, já foram pagos mais de um trilhão de reais em
tributos no Brasil.
Você
pode não acreditar, mas o Brasil não é a nação que mais paga tributo do mundo,
existem países em que a carga tributária é maior, como por exemplo a Dinamarca.
Todavia, na América latina o Brasil é o segundo país que mais cobra imposto,
atrás apenas de Cuba. Ainda assim, segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Planejamento
Tributário – IBPT – o brasileiro trabalha mais de 5 meses no ano para pagar
impostos.
Agora vamos entender um pouco porque pagamos
tantos tributos, desmistificar algumas ideias, compreender para que eles servem
e a sua função na sociedade.
Ao longo da história e ao redor do mundo,
a renda do particular foi constantemente utilizada para a manutenção de
diversas formas de governo, a despeito do regime político ou modelo de
economia, os tributos eram cobrados e os povos eram submetidos a diferentes
modalidades de cobrança.
Em muitos momentos do passado a cobrança
do tributo não tinha a menor identidade com os princípios constitucionais
contemporâneos, portanto, era frequente o recolhimento com uso de
arbitrariedades, violência, constrangimento, bem como restrição de direitos e
confisco de bens.
Ante o autoritarismo,
diferenças sociais e insatisfação com a destinação dos recursos, surgiram
movimentos para preservação da propriedade e garantia da liberdade individual e
pela participação nas decisões públicas que culminaram em importantes marcos
históricos, dentre eles, a elaboração da Carta Magna da Inglaterra em 1.215 que
limitava os poderes da monarquia, inclusive na cobrança de tributos.
Quase seiscentos anos
depois, em 1789, a declaração francesa dos direitos do homem e do cidadão determinou
que os tributos deveriam ser pagos pelos cidadãos atendendo o que chamamos hoje
de capacidade contributiva.
O Brasil era propriedade de Portugal e
reconhecida como uma fonte de exploração. Naquela época a insatisfação com as
altíssimas cargas tributárias impostas à população, assim como a falta de
investimentos culminaram em revoltas como a Inconfidência Mineira e a Revolução
da Farroupilha no Rio Grande do Sul.
Atualmente no Brasil – Estado
Democrático de Direito – a tributação é prevista na Constituição da República e
dela se extrai princípios, direitos e garantias fundamentais que protegem os
contribuintes dos excessos e abusos de poder outrora praticados.
Entretanto, o que se perpetua no
comportamento do brasileiro é uma verdadeira aversão quando o assunto é
tributação.
O fato é, em nosso território acontece
um verdadeiro cabo de guerra quando o assunto é tributação. De um lado o fisco e
as procuradorias unindo esforços em prol de alcançar as verbas sonegadas e do
outro o contribuinte, analisando todas as maneiras possíveis de encontrar na
legislação soluções para que o tributo se torne menos oneroso. E existe ainda,
aquele que é meramente inadimplente, o chamado devedor contumaz.
Porém, é utopia pensar
na formação de um Estado estruturado e operacional sem que haja cobrança de
tributos.
Hugo de Brito Machado e
Leando Paulsen, teóricos do direito tributário, abordam essa questão e dão a
seguinte diretriz: “O Tributo tem por finalidade suprir os cofres públicos dos
recursos financeiros necessários ao custeio das atividades do Estado”
(MACHADO,2010, p.57).
“A
tributação é instrumento da sociedade”, dentro de um Estado que preza pelos
direitos fundamentais e sociais, “a tributação proclama e promove direitos como
liberdade de expressão, inviolabilidade da intimidade e da vida privada, o
exercício da propriedade, a garantia de igualdade, a livre iniciativa a
liberdade de manifestação do pensamento a livre locomoção” (PAULSEN, 2018, p.23
e 24).
A constituição estabelece como dever
fundamental do cidadão, além de pagar tributo, colaborar com as informações
fiscais exigidas (obrigações acessórias). Estas práticas não deveriam ser consideradas
como um mal necessário, uma vez que o cidadão precisa de um Estado com recursos
para fornecer serviços essenciais, como segurança, saúde, saneamento básico,
educação etc.
Vale lembrar que – gostando ou não – a
estrutura governamental, tal como o executivo, o legislativo e o judiciário se
sustentam e se mantém de forma organizada, porque um bocado da riqueza do
particular é usada para pagar salários, adquirir insumos, manter estruturas em
condições de funcionamento, entre outras coisas.
Em outras palavras, o estado democrático
e social foi pensado para que todos venham a contribuir, pagando os tributos –
seja aquele que possui menos ou mais recursos – para que todos possam usufruir
de um estado estruturado e em funcionamento, sendo entregue o mínimo
existencial a todos os cidadãos.
É bem verdade que na prática o
brasileiro mal vê a contraprestação acontecer, pois a entrega do mínimo
existencial acontece cada vez mais de forma precária.
Segundo a pesquisa realizada pelo IBPT
entre os 30 países com a maior carga tributária no mundo, o Brasil é o que tem
o menor índice de retorno e bem estar para sociedade, este triste resultado é
experimentado rotineiramente pelo contribuinte.
O modo como ocorre a tributação no
Brasil também é duramente criticado, porque decorre de um sistema injusto, uma
vez que a nossa tributação tem grande foco na comercialização de produtos e na
prestação de serviços (ISS e ICMS) e, por consequência, todos os contribuintes acabam
pagando o mesmo valor de tributo sobre estas operações, seja ele milionário ou
aquele que vive em condições de miserabilidade.
Muitos apontam a tributação em si como o
vilão e, levando em consideração que a contraprestação não ocorre como deveria,
esta crítica pode facilmente fazer sentido e ser reproduzida. Infelizmente, a
corrupção e anos de péssima gerência que perduram em nosso país são fatores
determinantes para que o Estado não tenha capacidade de entregar os serviços
essenciais de qualidade, assim como acontece em outros países que possuem uma
tributação consideravelmente alta.
A instabilidade política e jurídica
também são fatores que impedem que o ambiente de negócios no território
nacional seja propício e, consequentemente, o mercado de trabalho acaba sendo
afetado, o que gera uma maior insatisfação aos brasileiros que não só não veem
suas necessidades atendidas pelo Estado como, ainda, não podem atende-las, por
conta própria, em consequência da defasagem de vagas de emprego e bons
salários.
Possíveis soluções que podem aliar a
tributação, que como já vimos é indispensável, à contraprestação merecida e
devida aos cidadãos é, em primeiro lugar, a realização de uma reforma
administrativa que, infelizmente, ainda não tem previsão para votação no Congresso
Nacional, que intenta reavaliar e até mesmo reduzir muitas despesas com a máquina
estatal o que poderia reduzir também os encargos tributários.
Em segundo lugar, a reforma tributária,
que já está em discussão no Congresso Nacional, porém suspensa em razão do
COVID 19, tem como principal objetivo a simplificação no pagamento dos tributos,
pois pretende realizar uma unificação de alguns impostos o que resultará em
redução de gastos para o contribuinte.
Até porque as despesas com as obrigações
acessórias (aquelas necessárias a comprovar que pagamos o tributo de forma
correta) são tão altas quanto o próprio tributo.
Em síntese sabemos que a onerosa,
burocrática e confusa tributação é realmente um fator de grande relevância que
nos leva a acreditar que a tributação é um vilão ainda em nossos dias. E a
corrupção, insegurança jurídica e a instabilidade política, também são
determinantes para reforçar essa ideia.
Excluindo
o fato de termos um procedimento de tributação confuso e oneroso, aliado a
décadas de corrupção e péssima gerência dos recursos públicos, devemos lembrar
que os tributos são indispensáveis, quando bem aplicados, à manutenção das
políticas públicas básicas de educação, saneamento, segurança e saúde.
É, portanto, dever de todo o cidadão
cuidar para que os nossos tributos, pagos por muitos com dificuldade, não sejam
motivo de frustração e, sim, instrumentos para que o Brasil alcance,
finalmente, o status de país desenvolvido.
Maby Bezerra da Silva
Contato: mabybezerradasilva@gmail.com
REFERÊNCIA
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, São Paulo:
Malheiros, 2010
PAULSEN,
Leandro. Curso de Direito Tributário
Completo, São Paulo: 8° ed. Saraiva, 2017
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