Todos nós já ouvimos em algum momento da vida alguém dizendo que sofreu algum tipo de dano moral causado por outrem. Sendo certo que na visão simplista da sociedade o dano nada mais é que uma consequência injusta resultante de uma humilhação, é certo que o dano moral é entendido no meio jurídico de uma forma muito mais complexa e estruturada.
A nossa Constituição Federal, mais especificamente no seu artigo 5º, X, garante que qualquer indivíduo que sofra ofensa à esfera moral deverá ser indenizado pelos danos sofridos. Da leitura do dispositivo em questão podemos destacar a aproximação com um dos princípios constitucionais mais importantes, o Princípio da Dignidade Humana.
Não somente a Constituição Federal regula o dano moral. Podemos encontrar exemplos claros no Código de Defesa do Consumidor e no próprio Código Civil, influenciando diretamente nas relações jurídicas pertinentes ao direito de família e também no direito do trabalho, sem falar na esfera criminal.
Diferente do dano material, que pode ser quantificado em valores desde o seu início, o dano moral requer uma análise mais profunda da situação, para que dele possa se extrair o real dano causado.
Passamos a imaginar,
por exemplo, uma relação de consumo em que uma pessoa comprou uma passagem
aérea e no momento do embarque descobre o cancelamento do seu voo devido a
problemas na aeronave. Além disso, o próximo voo é somente no dia seguinte. Até
aí podemos não vislumbrar com clareza o dano moral sofrido pelo passageiro, por
causa dos riscos do serviço ofertado e suas variantes. Porém, a partir do
momento que a companhia aérea deixa de prover alimentação, hospedagem,
transporte e outros itens necessários visando sanar o máximo a perda de tempo
do passageiro, o dano moral já começa a ser perceptível, uma vez que apenas uma
das partes na relação cumpriu com suas obrigações. Consequentemente, somente a
partir deste momento que passamos a analisar a reparação adequada, seja ela
através de valores ou até em forma de uma obrigação de fazer por parte da
companhia aérea.
Partindo desse ponto,
nos casos em que o dano moral esteja sendo discutido judicialmente, o juiz
deverá sintetizar diversos fatores para a decretação do dano causado e quanto
dele deve ser indenizado.
Para Clayton Reys, jurista e professor de direito, o valor a ser fixado deve levar em conta diversos fatores:
"Dentre alguns desses elementos que poderão motivar a decisão do juiz, poderão ser destacados, através de uma análise singela nesta oportunidade, a repercussão do ilícito no meio social, a intensidade da angustia experimentada pela vitima (que depende da análise dos fatores culturais, sociais e espirituais do lesado), bem como a situação patrimonial do agente lesionador e da vítima"
Portanto, a fixação
dos valores seguirá conforme os fatores elencados e também com base nas
decisões por analogia de casos concretos julgados pelos Tribunais.
Contudo, ao retornarmos e analisarmos o caso acima, não podemos deixar de observar que esse dano
moral deriva do que chamamos no mundo jurídico de responsabilidade civil, que
nada mais é que a natureza obrigacional que decorre justamente da prática causada
pela pessoa que pratica o dano. É a responsabilidade civil que delimita ou não
a culpa do agente causador do suposto dano.
Não obstante, devemos
destacar que a responsabilidade civil é dividida em duas frentes: a
responsabilidade subjetiva e a responsabilidade objetiva. A primeira engloba de
fato a culpa do agente causador, sendo a peça mais importante para caracterizar
o dano ou não, enquanto que a segunda é caracterizada pela responsabilidade que
ocorre independente da culpa, ou seja, quando questionada em juízo independe se
a mesma contribuiu para a situação ou não.
Daí retornamos ao
nosso exemplo e podemos perceber que nesse caso a responsabilidade será
objetiva, ou seja, independente de culpa, porque para o Código de Defesa do
Consumidor, que regulamenta as relações consumeristas, os fornecedores de
serviços precisam ser responsabilizados pelos danos causados, independentemente
de culpa. Tudo isso se dá pelo risco que o fornecedor de determinado serviço assume,
como são os casos das companhias aéreas. Eles assumem os riscos e são obrigados
a repará-los quando algo sair do controle.
Passando adiante, é
importante destacar que nem sempre o que achamos que é caracterizado como dano
moral o ordenamento jurídico reconhece da mesma forma. Hoje, inclusive, existe um esforço para evitar
a banalização do instituto com indenizações exageradas ou inexistentes,
vinculadas ao chamado mero aborrecimento, que é aquilo que pode acontecer no
cotidiano de qualquer pessoa, mas não chegando ao nível de causar qualquer
dano.
Surpreendentemente, até a pessoa jurídica é capaz de sofrer dano moral, mesmo não possuindo honra subjetiva. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, através da súmula 227, o dano moral nesses casos será detectado quando a empresa comprovar efetiva lesão a seu nome, reputação, credibilidade ou imagem, a ponto de prejudicar a sua própria atividade comercial.
Concluindo, podemos perceber a força que o dano moral tem no ordenamento jurídico brasileiro, sendo utilizado de forma frequente para reparações de caráter não materiais e sendo norte para as devidas indenizações, e apesar de existir o cuidado e a preocupação para não transformá-lo em uma industria que o banaliza, não há qualquer indício de que nos próximos anos veremos uma limitação maior para a sua decretação.
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