ABORDAGEM POLICIAL

 

 


“Mão na cabeça, encosta na parede e afasta as pernas, me dá seu documento; Tem algum entorpecente? Já teve passagem? Está vindo de onde?”

Quem nunca recebeu algumas dessas ordens, ou ouviu algumas dessas perguntas? Bom, se você nunca passou por isso, considere-se privilegiado por ser um cidadão que não levanta suspeita ao caminhar por ai! É bem verdade que nem todos passam isentos pelo olhar policial, e alguns são abordados muitas vezes, até mais de uma no mesmo dia – não sabemos exatamente por qual motivo -, e esses sabem muito bem como funciona o procedimento.

Algumas pessoas não entendem ou não toleram ser abordadas pela polícia, porém, há de se esclarecer qual a finalidade e a importância de tal ato. A polícia militar(principalmente) por ser uma polícia ostensiva, a qual se faz presente buscando evitar o cometimento de crime ou contravenção, é a que mais aborda quando falamos do cotidiano, e por isso, para melhor entendimento, trataremos da rotina desta força. Diariamente, o policiamento é realizado com intuito de fiscalizar e reprimir a criminalidade, e uma das formas de antecipar determinados atos é buscando identificar potenciais infratores. Para isto, são realizadas blitz em vias para fiscalização de veículos e condutores, bem como são realizadas abordagens aleatórias a transeuntes em geral.

A abordagem policial deve pautar-se em uma fundada suspeita gerada por aquele indivíduo, caracterizada por uma série de condições analisadas pelo policial, como por exemplo horário, local, comportamento ou ocorrência de algum delito na região cuja característica do suspeito bata com a de alguém que está na rua. Não deve jamais justificar-se por cor de pele, vestimenta, orientação sexual ou gênero, e em relação à essas condições, sabemos que a realidade é outra.

Durante a intervenção, é necessário manter a calma, pois ainda que o abordado se sinta constrangido, deve haver o entendimento de que tal atitude é necessária para sua própria segurança, pois as blitz e abordagens de rotina recuperam carros e demais objetos roubados, capturam fugitivos da justiça, impedem que crimes sejam cometidos e até localizam pessoas que estão sendo procuradas por suas famílias e encontram-se na rua em decorrência de problemas mentais. Tratar o policial com ignorância como se o agente detivesse a obrigação de apenas com o olhar, determinar quem deve algo à justiça ou não, perguntar se “tem cara de bandido”, recusar-se a atender as ordens policiais e a permitir o prosseguimento da abordagem acaba sendo uma das reações mais comuns das pessoas que se sentem incomodadas ao lidarem com essa situação, e tais atitudes geram consequências. Cabe ressaltar que, quem desobedece a ordem de agente público incorre no crime do artigo 330 CP, o qual apresenta como pena detenção de 15 dias a 6 meses e multa, e quem profere xingamentos à agente público, desacatando-o no exercício de sua função ou em razão dela ,incorre no crime do artigo 331 CP, o qual apresenta pena de detenção de 6 meses a dois anos ou multa (Mais conhecidos como crime de Desobediência e Desacato a autoridade).

De acordo com a reação do indivíduo abordado, para cumprir a finalidade de realizar a revista e a verificação da situação civil ou criminal se necessário, garantir a sua integridade, bem como a da população à sua volta, o policial está autorizado a utilizar-se do uso moderado e progressivo da força para conter a resistência oferecida.

O conjunto dos níveis de uso da força utilizados pelo policial, juntamente com o conjunto dos níveis de submissão do agressor compõe os chamados “Modelos de Utilização do Uso Progressivo da Força”, que são espécies de protocolos, criados justamente para orientar o policial sobre a ação a ser tomada a partir das reações da pessoa que está naquele momento transgredindo a lei, ou simplesmente em atitude suspeita. Atualmente, existem inúmeros modelos espalhados pelo mundo, utilizados de acordo com a realidade com a qual a força policial respectiva lida. A Secretaria Nacional de Segurança Pública apresenta alguns modelos de uso progressivo da força em seu curso sobre o tema: FLETC, GILLESPIE e REMSBERG, PHOENIX, NASHVILLE e CANADENSE. Os modelos variam no formato (gráficos, círculos, tabelas) e no nível de força, avaliação da atitude do suspeito e percepção de risco (SENASP, 2006).

Apesar de extremamente necessário, até então não há legislação nacional tratando detalhadamente sobre o uso da força policial, delimitando a utilização de cada recurso, seja ele letal ou não. Porém no âmbito internacional, existem dois documentos de suma importância que orientam a conduta dos agentes cumpridores da lei: O Código de Conduta dos Encarregados de Aplicação da Lei, “CCEAL” foi adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em sua resolução 34/169 de 17 de dezembro de 1979 e o documento dos Princípios Básicos de utilização da força e de armas de fogo ”PBUFA” por funcionários responsáveis pela aplicação da lei, sedimentado no oitavo Congresso das Nações Unidas em Havana, Cuba, de 27 de agosto a 7 de setembro de 1990.

Tais documentos, tem por base alguns princípios que devem nortear a conduta policial, que são a legalidade, a necessidade, proporcionalidade e conveniência, que de forma resumida exprimem o seguinte: O agente deve portar-se de acordo com os parâmetros legais que amparam sua atuação, sem transgredir o limite entre energia e violência; analisar a necessidade do objetivo a ser atingido, para justificar o próximo passo, que será a proporcionalidade entre a reação do abordado e a sua ação para cumprir a determinação desrespeitada, bem como a conveniência em expor pessoas que estão em volta, à um possível risco.

Entretanto, nós brasileiros e com mais propriedade falando sobre os cariocas, sabemos que muitas vezes o uso da força não é progressivo e sequer é moderado. Muitos agentes já iniciam a abordagem de forma desrespeitosa, truculenta e humilhante, como se acima da lei estivessem. E aí mora o real perigo, pois provavelmente o abordado estará lidando com uma pessoa desequilibrada, e qualquer reação ou movimento brusco pode ser a fagulha necessária para uma descarga de ações descabidas e violentas. É necessário mais uma vez manter a calma. Assim como gentileza gera gentileza, violência gera violência, e a melhor forma de amenizar uma situação de opressão por qualquer autoridade, é obedecer às ordens e manter um tom pacífico de comunicação, pois se sua situação estiver isenta de apontamentos criminais, você será liberado.

Mas não é só o cidadão civil que está sujeito a responder criminalmente por suas atitudes, o policial também! Responde pela lei de abuso de autoridade o agente que de qualquer forma atentar sobre a liberdade de locomoção, obrigando a fazer algo que a lei não obriga, ou impedindo que faça algo que a lei permite, bem como o responsável por expor quem estiver sob sua guarda ou custódia mediante violência ou grave ameaça a situação vexatória ou constrangimento não permitido em lei. Bem como por qualquer outro crime que concorra, seja por lesão física, discriminação racial, homofobia e etc. A violência policial não é permitida e não deve ser tolerada. A conduta omissiva de quem sofre, só perpetua tal realidade, e não separa os policiais bons dos ruins, pois não são todos que agem dessa forma.

Se você foi agredido, humilhado, sofreu algum tipo de discriminação ou entende que o policial agiu de forma desproporcional à situação, após ser liberado é a hora de você exercer seus direitos e utilizar-se das armas que o estado te fornece. O abordado tem o direito de perguntar o motivo da abordagem, solicitar a identificação dos policiais, registrar número e placa de viatura. Com estes dados, você deve procurar uma delegacia e realizar um registro de ocorrência, ou dar ciência dos fatos ao Ministério Público que será o titular de uma possível ação penal, já que neste caso é pública incondicionada. Você poderá apresentar vídeos, fotos, relatar os fatos e indicar testemunhas para sedimentar suas alegações. Ao contrário do que o senso comum exara, o que não adianta é manter-se inerte e omisso frente ao desrespeito sofrido. Denuncie!

 

 

 

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